A
Associação de Pais e Amigos de Surdos e Outras Deficiências
(APASOD), de Vila Velha/ES, e outras seis ONGs brasileiras preparam
uma ampla pauta de reivindicações junto ao Ministério da Mulher,
da Família e dos Direitos Humanos (MDH), com destaque para a
intervenção junto aos ministérios da Saúde e da Educação, para
que trabalhem sincronicamente no atendimento às necessidades de
crianças e adolescentes com deficiência auditiva e usuários de
tecnologia, como implante coclear, de Baha e de tronco
cerebral.
Duas
agendas já estão confirmadas, com a ministra Damares Alves e com
sua secretária nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência,
Priscila Gaspar, que é a primeira surda a assumir um cargo no
segundo escalão do Governo federal, segundo divulgou o site do
MDH.
A
jornada de quatro dias das sete entidades, no mês de julho, quer
incluir ainda agendas com os Ministérios da Saúde e da Educação.
“A gente quer um ‘casamento’ do MEC e da Saúde”, propõe
Lourdilene Mozer, presidente da Apasod.
“Senão, vão
continuar jogando rios de dinheiro fora”, complementa Geraldine
Brustembug, da Associação dos Surdos Oralizados do Rio Grande do
Sul (ASICS), referindo-se à falta de atendimento pós-cirurgia por
parte da Saúde e, principalmente, ao despreparo das escolas públicas
para apoiar o desenvolvimento cognitivo das crianças e adolescentes
implantados.
Em
síntese, explica Geraldine, a necessidade pedagógica é por métodos
que associem o visual e a escrita, o fonético-visual, muito
utilizado até a década de 1980 no Brasil, quando houve uma
priorização do método construtivista, mais abstrato e de difícil
compreensão pelos deficientes auditivos.
“A
questão não é só o ouvir, é o falar e o compreender também. A
audição com implante coclear só dá o ouvir, mas o resto todo tem
que ser processado no cérebro e requer metodologia diferenciada e um
tempo para amadurecer”, explica. “É como você aprender japonês
aqui e ir para o Japão. Leva um tempo até você se tornar fluente
em japonês”, compara.
“O
Ministério da Saúde faz o implante, mas não dá assistência.
Quando esse aluno chega na escola pública, ele tem, quando muito, o
intérprete de LIBRAS [Língua Brasileira de Sinais] e tem que tirar
o implante”, narra. “O deficiente auditivo, com implante, não
tem direito a uma metodologia especializada. Vamos a Brasília pedir
uma metodologia pra eles”, diz.
Aqui,
ressalta a ativista da ASICS, fica explícita a separação entre
duas formas de cuidar da comunicação da criança surda e que levou
a uma polarização entre os próprios surdos, a qual as legislações
de Acessibilidade e de Educação e a Medicina têm procurado
conciliar.
Nessa
distinção, surdos são os usuários de LIBRAS. Já os usuários de
tecnologias, como aparelhos auditivos e implantes, como o coclear, de
Baha e de tronco cerebral, são considerados deficientes auditivos.
“Os usuários de LIBRAS não se consideram deficientes, consideram
que têm uma cultura própria, a cultura dos surdos”,
explica.
Evasão
escolar
A
falta de preparo dos equipamentos públicos tem refletido em
estatísticas tristes, afirma Geraldine. Citando o Censo de 2019 do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a ativista
informa que 60% das pessoas com deficiência no Brasil não têm
instrução ou não possuem o primeiro grau completo e que somente 5%
das pessoas com deficiência que entram na escola chegam ao ensino
médio, segundo o Censo Escolar de 2010 – Educação Especial.
A
diretora da ASICS também ressalta o impacto positivo provocadas por
duas Ações Civis Públicas, uma impetrada pelo Ministério Público
Federal em São Paulo contra a Agência Nacional de Saúde (nº
0004415-54.2011.4.03.6100) e a outra ajuizada pela Defensoria Pública
da União contra a União, Estado e Município do Rio de Janeiro (nº
0007197.51.2011.4.02.5101). Em tais ações, diz, “foram
solicitadas várias alterações nas portarias do Ministério da
Saúde e da ANS. O Poder Público, no entanto, não as tem cumprido”,
lamenta.
Autoestima
e autonomia
Na
esteira desse casamento entre Saúde e Educação, as entidades
elencam alguns pontos a serem trabalhados na capital federal:
dificuldades na manutenção, consertos e compra de aparelhos,
dificuldades no ensino público e privado de crianças e adolescentes
(metodologias de ensino), autonomia e autoestima do surdo,
regularização de parcerias com os profissionais vinculados ao
Programa de Implante Coclear do Governo Federal, empresas de implante
coclear e o Ministério da Educação para melhoria do ensino e
capacitação de professores.
Integram
a caravana, além da Apasod e da ASICS, a Associação Amazonense de
Apoio aos Deficientes Auditivos e Usuários de Implante Coclear
(AMADA), a Associação dos Deficientes Auditivos, Pais, Amigos e
Usuários de Implante Coclear do Estado do Pará (ADEIPA), a
Associação dos Alunos, Familiares, Ex Alunos e Amigos da Escola
Epheta – Curitiba/PR, a Associação de Crianças e Adolescentes
Surdos do Rio Grande do Sul (ACAS) e a Associação Mato Grossense de
Apoio à pessoa com deficiência auditiva (ADAIC).