Jovem recebeu auxílio de intérprete, mas tradução foi apenas de palavras.
Profissional diz que surdos precisam entender o contexto das orações.

 Noticia_20141110-3A_ImagemUma estudante surda de Santos, no litoral de São Paulo, encontrou dificuldades para responder às questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), realizado no último fim de semana. Embora uma legislação específica garanta que o candidato com deficiência auditiva receba auxílio de um intérprete em Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), as duas profissionais que assistiram Natália Carla, de 19 anos, traduziam apenas palavras, seguindo uma recomendação da coordenadoria regional da prova. A norma dificultou a interpretação do contexto das perguntas e alternativas por parte da jovem, já que LIBRAS não utiliza preposições ou conectivos em textos, como a língua portuguesa. A estudante escreveu uma carta de próprio punho e levará o caso à promotoria de Justiça, sugerindo mudanças.

No documento, ela relata a dificuldade que encontrou durante o exame. “O surdo não entende a estrutura da língua portuguesa. Apenas quem fala português entende o Enem. Os surdos precisam de interpretação do conteúdo de toda a prova. Não entendi nada. Precisamos de Tudo em Libras, por favor”, pede a jovem.

As provas do Enem devem seguir a Recomendação nº 001/2010 do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade) que aborda sobre “a aplicação do princípio da acessibilidade à pessoa surda ou com deficiência auditiva em concursos públicos, em igualdade de condições”. Libras foi oficializada como a segunda língua brasileira, após a publicação da Lei nº 10.436/2002

Noticia_20141110-3B_Imagemintérprete de Libras e professora do Instituto Federal de São Paulo, Campus Cubatão Elayne Kanashiro, explica que a leitura do surdo é diferente da de quem possui uma audição perfeita. Segundo ela, que é professora da garota mas não a acompanhou durante a prova, os surdos profundos, como são chamados aqueles que não escutam nenhum tipo de som, precisam entender o contexto da frase. “Embora eu não tenha trabalhado na prova, conversei com várias colegas e alunos que me relataram essa dificuldade. O intérprete foi direcionado a traduzir apenas as palavras por recomendação que recebeu dos coordenadores. O problema é que precisamos respeitar o contexto do surdo, com a interpretação das palavras e orações”.

Noticia_20141110-3C_Imagem No entanto, uma recomendação do próprio site do Enem deixa dúvidas. No regulamento consta que, em caso de dúvida nas orações o candidato pode pedir ajuda. “Mas como você só vai traduzir palavras se eles não compreendem somente as palavras soltas?”, questiona.

Natalia é aluna de Elayne e relatou a dificuldade à intérprete. Ela pediu ajuda para levar o caso à promotoria de Justiça, pedindo atenção à causa. “Ela ficou desmotivada, porque ninguém traduziu nada, somente palavras e ela não entendeu o contexto. Poucas coisas e isso não adianta. Nem alternativa nem pergunta. A menina saiu sem entender. Ela não conseguiu se concentrar para entender o que estava escrito porque ficou nervosa com a situação”, revela.

A jovem finaliza a carta fazendo um apelo: “Eu quero uma intérprete para traduzir tudo e eu entender bem”, afirma.

Em nota, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), responsável pelo Enem, afirma que vai aguardar a chegada das atas dos locais e analisar as ocorrências.

*Colaborou Wagner Tavares, da TV Tribuna

Fonte: http://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2014/11/nao-entendi-nada-afirma-estudante-surda-que-prestou-prova-do-enem.html

One thought on “Não entendi nada’, afirma estudante surda que prestou a prova do Enem”
  1. Saber ler e ouvir é apenas uma parte da comunicação. Eu posso ler um texto tecnico, por exemplo, e não entender absolutamente nada.
    É importante lembrar e ressaltar que LIBRAS não é português.
    A forma de compreender um texto, seja falado ou escrito, é diretamente ligada a nossa cultura e no caso dos surdos, eles possuem a “Cultura Surda” que engloba entre outras coisas a maneira como os textos são contextualizados e o uso da gramatica própria da LIBRAS.
    O surdo se relaciona com o nosso português da mesma maneira que nos nos relacionamos com o inglês, por exemplo ( logicamente propondo que você não sabe ingles).
    Na construção do texto escrito, assim como na fala, o surdo posiciona a “negação” após o verbo ao contrario de nós, ouvintes, que colocamos a negação na frente.
    Imaginemos a seguinte oração: SORRIR NÃO CHORAR. Todo ouvinte, provavelmente, interpretaria como um conselho para que não chorasse, mas que sorrisse. O surdo por sua vez entenderia exatamente o oposto, visto que na cultura surda primeiro ele fala (através de sinais) o verbo depois a negação, ou seja, ele entenderia “sorrir não, chorar”. Se em uma frase tão pequena já existe esta dificuldade, imagine em uma prova de concurso ou mesmo durante o aprendizado do ensino regular.
    É fundamental que aprendamos como o surdo “vivencia” sua comunicação e com isso se relaciona com o mundo, afinal, nós não vivemos num mundo só.

  2. Saber ler e ouvir é apenas uma parte da comunicação. Eu posso ler um texto tecnico, por exemplo, e não entender absolutamente nada.
    É importante lembrar e ressaltar que LIBRAS não é português.
    A forma de compreender um texto, seja falado ou escrito, é diretamente ligada a nossa cultura e no caso dos surdos, eles possuem a “Cultura Surda” que engloba entre outras coisas a maneira como os textos são contextualizados e o uso da gramatica própria da LIBRAS.
    O surdo se relaciona com o nosso português da mesma maneira que nos nos relacionamos com o inglês, por exemplo ( logicamente propondo que você não sabe ingles).
    Na construção do texto escrito, assim como na fala, o surdo posiciona a “negação” após o verbo ao contrario de nós, ouvintes, que colocamos a negação na frente.
    Imaginemos a seguinte oração: SORRIR NÃO CHORAR. Todo ouvinte, provavelmente, interpretaria como um conselho para que não chorasse, mas que sorrisse. O surdo por sua vez entenderia exatamente o oposto, visto que na cultura surda primeiro ele fala (através de sinais) o verbo depois a negação, ou seja, ele entenderia “sorrir não, chorar”. Se em uma frase tão pequena já existe esta dificuldade, imagine em uma prova de concurso ou mesmo durante o aprendizado do ensino regular.
    É fundamental que aprendamos como o surdo “vivencia” sua comunicação e com isso se relaciona com o mundo, afinal, nós não vivemos num mundo só.

  3. Saber ler e ouvir é apenas uma parte da comunicação. Eu posso ler um texto tecnico, por exemplo, e não entender absolutamente nada.
    É importante lembrar e ressaltar que LIBRAS não é português.
    A forma de compreender um texto, seja falado ou escrito, é diretamente ligada a nossa cultura e no caso dos surdos, eles possuem a “Cultura Surda” que engloba entre outras coisas a maneira como os textos são contextualizados e o uso da gramatica própria da LIBRAS.
    O surdo se relaciona com o nosso português da mesma maneira que nos nos relacionamos com o inglês, por exemplo ( logicamente propondo que você não sabe ingles).
    Na construção do texto escrito, assim como na fala, o surdo posiciona a “negação” após o verbo ao contrario de nós, ouvintes, que colocamos a negação na frente.
    Imaginemos a seguinte oração: SORRIR NÃO CHORAR. Todo ouvinte, provavelmente, interpretaria como um conselho para que não chorasse, mas que sorrisse. O surdo por sua vez entenderia exatamente o oposto, visto que na cultura surda primeiro ele fala (através de sinais) o verbo depois a negação, ou seja, ele entenderia “sorrir não, chorar”. Se em uma frase tão pequena já existe esta dificuldade, imagine em uma prova de concurso ou mesmo durante o aprendizado do ensino regular.
    É fundamental que aprendamos como o surdo “vivencia” sua comunicação e com isso se relaciona com o mundo, afinal, nós não vivemos num mundo só.

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